sábado, 15 de dezembro de 2012

caos




No meu aniversário eu tive a opção de comemorar com um jantar em família ou teatro com parte dela.

Preferi a segunda opção, e preferiria qualquer outra que não precisasse juntar todo mundo na mesma mesa.

Não que eu não goste de alguns, pelo contrário, são pessoas que eu queria por perto sempre, mas separados uns dos outros, porque conhecendo a personalidade e temperamento de cada um deles, já sabia que seria um desastre.

Se vingasse o jantar, seria assim:

Iria com minha família - mulher, filha, filho com namorada e minha cunhada com o marido - num  restaurante chique, caro, com comida gostosa e cheia de frescura.

Antes de nos acomodarmos na mesa, eu iria para o banheiro rezar pra dar tudo certo naquela noite, pra ninguém ser ferido, preso ou morto e aproveitar para fazer minhas necessidades fisiológicas.

No caminho para o banheiro já ouviria o décimo: "Pára, chato! Mamãe, aqui ele mexendo comigo. Manda ele parar!" - diria minha filha irritada com o irmão adolescente, sendo adolescente. 

"Deixa ela em paz! Não está vendo que ela não está gostando?" diria impacientemente a namorada do meu filho, a também adolescente.

"Você não acha que já está bem grandinho pra ficar implicando com uma criança 10 anos mais nova que você?!" - diria minha mulher para o filho.

Este, por sua vez, também ficaria irritado e responderia: "Não posso fazer nada com essa garota, que tudo ela reclama, aí fica todo mundo contra mim. Que droga!"

"Ela estava quieta até você começar." - lembraria a mãe.

"Você que é culpada por essa garota ser fresca assim, você mima demais, por qualquer coisinha ela chora..." - diria o rebelde.

A namorada faria coro à sogra: "Se você brincasse direito, sem irritá-la, ela não reclamaria." 

"Você é outra que também nunca me apóia em nada, tá sempre contra mim. Pra você os outros estão sempre certos..."

"Como é que eu posso te apoiar com você fazendo uma palhaçada dessa? Só se eu fosse outra..."

"Outra o quê? Fala que eu sou retardado logo!" - esbravejaria o menino com o cão.

"Gente, pára com isso! Vocês agora vão discutir por causa de uma besteira dessa?" - diria minha cunhada tentando acalmar os ânimos.

"Eu ia dizer outra criança, mas retardado também serve." - e com a voz embargada, a namorada continuaria: "Não é por isso não, tia, é que agora ele deu pra me culpar por tudo que acontece, seja porque não apóio essas palhaçadas, ou porque não concordo com o que ele acha que eu devo concordar, ou porque não faço as suas vontadezinhas... ele não pode ser contrariado ou criticado nunca, se não ele faz esse show..."

Vendo a tão adorada cunhada chorando, minha filha também choraria e gritaria para o irmão: " Você fez ela chorar, seu chato!"

Para não perder o controle, já perdido, a mãe falaria para a criança: "Você fica quieta que isso não é assunto de criança!" - aumentando a choradeira dela, que soluçaria: "Você ainda briga comigo, em vez de brigar com ele..."

"Tadinha, ela não tem culpa." - diria chorando também a minha nora defendendo a cunhadinha.

"Você acha isso legal, deixar sua namorada e sua irmã nesse estado?! Acorda, cara, olha o que você está fazendo com quem gosta de você...você acha isso certo? Você já é um homem, tem que agir como adulto, tá parecendo até que é da idade da sua irmã..." - falaria a tia chamando a atenção do rebelde.

Observando tudo calado até esse momento, o marido da minha cunhada estrearia na discussão dizendo para a mulher: "Você quer apagar o incêndio com gasolina, faz que nem a mãe dele fala só uma vez e pronto. Pára de se meter no problema dos outros."

Possessa, minha cunhada retrucaria: "Eles não são os outros, são minha família também e eu me meto sempre que eu achar que posso ajudar."

"Assim você só ajuda a piorar as coisas, deixa os pais educarem como acharem que devem." - diria o marido tão estourado quanto à mulher.

"Só que eu  não consigo assistir o circo pegar fogo e ficar quieta. Não tenho sangue de barata. Se minha irmã tem, o problema é dela. ." - diria minha cunhada sem perceber a merda que fez...

"Tava demorando... Você fala isso porque não tem que trabalhar, cuidar da casa, do marido e dos filhos... muito fácil falar dos outros, quero ver ficar um dia no meu lugar..." - se defenderia minha mulher, mais atacando do que se defendendo.

"Tá vendo o que você me faz falar" - disse a cunhada para o marido.

"Que eu te faço falar?! agora a culpa é minha?!"

Então ficaria assim:

Minha mulher discutindo com a irmã; que discutiria  com o marido; as duas e a nora discutindo com meu filho; que discutiria com a namorada e com a irmã; que discutiria com o irmão e a mãe; que se uniria ao cunhado contra a irmã; que mandaria as meninas pararem de chorar, que chorariam mais; que também se uniriam contra a minha cunhada e a minha mulher; que seria reanimada pelos ocupantes da outra mesa depois de passar mal, enquanto meu cunhado discutiria com o mitre que tentava expulsá-los; que discutiria com os seguranças que não conseguiam conter o caos; que discutiriam entre eles; que discutiriam com o delegado, que daria entrevista aos jornais dizendo que:

"Estamos investigando as causas desse crime, que segundo testemunhas, começou com um grupo de baderneiros que provocou um quebra-quebra e logo depois o incêndio. Sim, tudo indica que era um crime
premeditado pelos acusados, que para não levantar suspeitas chegaram a reservar mesas para
um suposto aniversário, mas sem nenhum aniversariante, o que leva a crer que já tinham a intenção de praticar o crime..."

E eu?! Eu estaria no banheiro concentrado para voltar no tempo e optar pelo teatro.