quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Pomada Japonesa





Ontem à tarde, estava tomando café no balcão de uma padaria, quando senti um suave toque no ombro. Foi tão suave, que nem pensei que alguém tivesse me tocado, mas que fosse esses espasmos involuntários que o corpo dá de vez em quando (será que só eu que tenho isso?).

Pois bem, olhei para o lado de onde veio o toque e vi um velhinho japonês rindo para mim e balbuciando alguma coisa.

Não parecia pedinte, estava bem arrumado com sua roupa típica de velhinho, acho que usava até uma boina e tinha um sorriso gostoso de quem tinha uma coisa muito engraçada para falar. Só que ele falava muito baixinho, muito mesmo, então quase grudei meu ouvido na sua boca velha pra ouvir o que ele tinha a dizer.

Não deu pra identificar se falou em português, japonês, se falou mesmo ou se apenas riu. Depois ele parou e ficou me olhando com aquele sorriso, como se esperasse a minha gargalhada no final da piada.

Simpaticamente, pedi que repetisse e cheguei mais perto dele, praticamente o abraçando com meu braço por cima do seu ombro, para ouvi-lo melhor.

Estava me sentindo humano de verdade com aquele gesto, útil, solidário, solícito, achei que fosse receber aplausos de toda a padaria emocionada por ter interagido com tamanha ternura com o bom velhinho japonês.

Fiquei me gabando achando que eu tinha algo especial que fez o senhor simpático me escolher, em meio ao mundo inteiro, para contar algo engraçado.

O coitado ainda tentou continuar, mas foi interrompido por uma senhora pouco mais nova do que ele, também japa, que o afastou de mim dizendo: "O que você está fazendo, papai? Deixa as pessoas em paz. Desculpa moço." E emendou: "Ele tem mania de falar com todo mundo. Me desculpa." - e se virando para o pai, falou: "Papai, deixa o homem comer em paz..."

Fiquei meio decepcionado, pensei que aquele sorriso, aquele interesse, carinho e simpatia fosse porque ele viu em mim uma pessoa confiável, respeitosa, um amigo mesmo...

Qual o quê?! Aquele sorrisão ele já devia ter escancarado para o bairro todo na sua caduquice, e depois de mim, quantos mais ele não irá tocar suavemente no ombro?...

A minha sensação de bem estar foi saindo de mim como gases, me deixando no meu lugar no meio da multidão.

Voltei ao meu café.

Pouco depois o velhinho volta até mim disposto a terminar "nossa conversa", e antes que a filha o puxasse para junto dela, eu o fuzilei com meu olhar de desprezo o recomendando, telepaticamente, que ficasse longe de mim com aquele sorrisinho, pois esse otário aqui, ele não ia mais iludir.

Vovozinhos são todos iguais.

Nada a ver, mas lembrei da pomada japonesa.