sexta-feira, 23 de março de 2012

merda!



 


Um amigo me contou que foi a um open house de um conhecido rico dele que não teve um final muito bom.

Disse que o anfitrião estava superfeliz pela aquisição da casa de três andares, vários cômodos espaçosos, decorada com luxuosa mobília, piscina, churrasqueira e jardim exuberante com design futurista, num condomínio chique e num bairro igualmente chique.

Mais feliz ele estava ainda por poder exibir tudo isso para todos os presentes, entediando cada grupinho de convidados em que parava, contando a origem de cada objeto da decoração, curiosidades,  motivo da escolha e preço. Sem falar nas fotos e souvenirs dos países que conheceu, onde comeu, o que visitou, onde se hospedou e quanto gastou. Quando resolvia impressionar outro grupo, trazia grande alívio ao grupo anterior que era dispensado com um desatento com licença.

Com o decorrer da festa, meu amigo que estava com sua esposa, já cansado de comer canapés sofisticados e beber bebidas caras, precisou ir ao banheiro. E nessas horas, pouco importa se o banheiro possui mármores carrara, porcelanatos de outro planeta, torneiras de ouro, ou se é um banheiro mal cheiroso de botequim.

Porém, como em toda festa, outras pessoas tiveram a mesma idéia ao mesmo tempo, lotando a porta do wc social do living room.   

Mas a sorte do meu amigo mudou quando encontrou no terceiro andar, outra fila menor para o banheiro. E melhorou mais quando duas garotas privilegiadas pela beleza que a idade e o dinheiro davam, ficaram imediatamente atrás dele na fila.

Para parecer um coroa descolado para as meninas, estufou o peito, encolheu a barriga e fez um sorrisinho meio sensual, o que segundo ele, chamou a atenção de uma delas que "não parava de me olhar".

Quando se deu conta, já era a sua vez.

Depois que começou a fazer suas necessidades, lembrou que, fatalmente, deixaria o banheiro com um odor nada agradável para as meninas, e que não adiantaria colocar a culpa em outra pessoa ao sair, pois a fila andou muito rápido, dando a entender que todos na sua frente apenas urinaram.

A única saída que viu era agir rápido para parecer que urinou demoradamente, ou fez o número dois rapidamente, afinal, nesse caso, melhor a dúvida do que a certeza.

Então, pôs o plano em prática fazendo tudo numa velocidade inacreditável. Num salto, já estava vestido, dando descarga e já lavando as mãos. Antes de sair porém, resolveu se certificar do sucesso do seu plano e abriu a tampa do vaso. Merda! Tinha uma teimosa que não acompanhou as amigas.

Insistiu em dar outra descarga, mas a caixa acoplada demorava a encher... "e aquele anfitrião filho da puta se gabando de ter tudo do bom e do melhor e com essa merda de descarga."

Quando finalmente a caixa acoplada encheu, deu outra descarga, mas ela continuava lá. Repetiu a operação de novo, de novo e de novo... mas ela ainda continuava lá.

Pensou em sair do banheiro e deixar aquele problema para o próximo resolver, mas os próximos seriam as meninas bizzarramente lindas, que nunca fizeram coco, ou tiveram meleca, remela ou suor. Não, não podia, de jeito nenhum...

Nessa altura, constatou que as meninas já sabiam que ele não estava apenas urinando. Imaginou elas entrando no banheiro, abrindo a tampa do vaso e dando de cara com aquela merda, sabendo que ele quem fez, que saiu dele... Sentiu um pânico carregado de vergonha e raiva que lhe fez chorar sentado na privada esperando mais uma vez a porra da caixa encher.

O som da água enchendo a descarga parou. Meu amigo levantou-se da privada, liberou a água da caixa e ficou acompanhando, esperançoso, o seu excremento lutando para não sumir no rodamoinho barulhento... expectativa...no fim, lá estava ela rindo dele, zombando dele, mostrando que ela conseguia envergonhá-lo, sua própria merda...

Num surto psicótico, ele deu um grito assustador de desespero, que certamente foi ouvido pelas meninas do lado de fora, agarrou a merda na mão, estendeu o braço, para fora do basculante com vista para o mar, e a soltou.

Depois de se recompor, acalmou a respiração, lavou as mãos, enxugou o suor da testa e saiu do banheiro sem olhar para os lados, sabendo que todos o fitavam perplexos com a gritaria que fez, mas sem nada questionar.

Ao descer encontrou os convidados agitados num burburinho, e sua mulher veio ao seu encontro com os olhos arregalados tentando explicar o que aconteceu, quando foi interrompida pelo próprio anfitrião que passou por eles chorando, amparado por outras pessoas, sujo de coco na cabeça e na camisa branca de grife, gritando: "Eu só chamei amigos para dividir comigo minha felicidade, e olha o que fizeram, meu Deus..."

Disse ele que, mesmo diante do mal estar que se formou, riu descontroladamente, e ri de chorar sempre que conta isso pra alguém.

terça-feira, 6 de março de 2012

feitos pra andar


Sempre achei voar o máximo.

Tenho inveja dos urubus e gaivotas que voam imponentes lá no alto, vendo tudo a seus pés e o infinito acima deles, não se importando com altura, com distância, alheios ao caos do mundo dos que pisam nesse chão. Fico imaginando a delícia de sensação  de dar uns rasantes, ter o céu inteiro para explorar, voar rápido, devagar, planar, chegar em locais que ninguém jamais vai chegar de outra forma.

Mas não me agrada a idéia de ter asas que nem os anjos porque seria bem incômodo esbarrá-las em todo lugar, fazer um buraco para elas nas camisas, jaquetas e cia., soltar pena, tomar cuidado pra não quebrá-las, queimá-las, sujá-las, dormir com aquelas porras nas costas então...

As asas dos morcegos são menos incômodas, já que não ficam nas costas, porém perderíamos as mãos, pois, pra quem não sabe, a asa é um prolongamento dos braços e dedos do animal.

Já asas de insetos que se recolhem, como os besouros, são mais úteis, entretanto voar com 4 asas batendo milhares de vezes por minuto me passa um desgaste, um cansaço só de pensar, seria mais um vôo apressado, nervoso, tenso, sem prazer, sem poesia... uma merda, melhor rastejar.

Voar sem asas pode ser a solução, mas que nem o super-homem com os braços estendidos pra frente e uma perna ligeiramente flexionada, nunca me encantou, aliás qual a razão dessa pose? Muito artificial.

Tem também o voo dos fantasmas, que, diferente do super-homem, é mais natural, com mais leveza, porém sem controle, limitado e fantasmagórico (obviamente), lembrando mais um saco plástico impulsionado pela brisa.

Peter Pan estaria mais próximo do que imagino, se não fosse a indiferença dele quando voa, como se fosse fácil e sem importância. Banal como piscar os olhos.

O ideal, pra mim, é que seja um vôo parecido com o nadar das arraias e das tartarugas,  com menos resistência, menos atrito, deslizando mais, para se ter toda liberdade no ar para mergulhar, girar, dar cambalhotas, subir, descer, ficar de costas, de cabeça para baixo... teria que ser antes de tudo, um lazer.

Pra isso, a gravidade não poderia ser tão severa, aliás, que exagero esse rigor  pra manter as coisas no chão, como se tudo quisesse fugir do planeta na primeira oportunidade. A gravidade poderia ser mais light deixando as coisas como que em slow motion, sem pressa, possibilitando admirar a beleza de qualquer coisa que caia, quebre e exploda.

Complicados que somos, trocaríamos os nossos vôos pessoais por uma carona em algum avião, usando como desculpa o cabelo que ficaria desarrumado com a velocidade, ou o frio que faz em algumas altitudes, ou os insetos que se esborracham na nossa cara, ou a mesma preguiça que nos impede de caminhar hoje em dia.

Aí voar já não seria liberdade, mas retrocesso, algo primitivo e antiestético, e voltaríamos a andar, pois pra isso que fomos feitos.

Nos restando apenas admirar os urubus e gaivotas, que despretensiosamente, dão um show.